O Brasil poderá perder totalmente a capacidade de investir em áreas como infraestrutura, saneamento e serviços públicos básicos a partir de 2027, segundo projeções da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado. O motivo é o avanço das despesas obrigatórias — gastos fixos como aposentadorias, salários do funcionalismo, Bolsa Família, saúde e educação — que já consomem mais de 90% do orçamento federal.
A análise da IFI aponta que, se essa trajetória continuar, o país enfrentará um “apagão fiscal”, situação em que todos os recursos arrecadados ficam comprometidos com despesas fixas, deixando sem espaço os investimentos considerados estratégicos para o desenvolvimento econômico e social.
Crescimento dos gastos e queda da arrecadação
De acordo com o diretor da IFI, Alexandre Andrade, as despesas do governo vêm crescendo em termos reais há vários anos, sem que a arrecadação acompanhe o mesmo ritmo. Ele lembra que medidas recentes, como a retomada da política de valorização do salário mínimo e a reativação dos pisos constitucionais de saúde e educação, aumentaram a pressão sobre as contas públicas.
A IFI projeta que:
- Até 2027, não haverá margem para custear serviços básicos, como manutenção de estradas e portos.
- A arrecadação federal deve cair de 18,3% do Produto Interno Bruto (PIB) para 17,7% até 2035.
- As despesas devem avançar de 18,9% para 20,4% do PIB no mesmo período.
- Até mesmo gastos operacionais de órgãos públicos, como combustível, energia e telefonia, poderão ser comprometidos.
Segundo Andrade, essa dinâmica eleva a relação dívida/PIB (indicador que mede o tamanho da dívida em relação à riqueza gerada pelo país), o que aumenta a percepção de risco entre investidores, encarece os juros e limita o crescimento econômico.
Transparência e controle social
Enquanto os desafios fiscais crescem, entidades empresariais tentam ampliar a transparência sobre o uso do dinheiro público. A Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) lançou a plataforma Gasto Brasil, que permite acompanhar em tempo real as despesas de União, estados e municípios.
O presidente da Associação Comercial e Industrial de Uberlândia (Aciub), Fábio Túlio Felippe, avalia que a ferramenta fortalece a participação cidadã:
“O Gasto Brasil permite que entidades acompanhem, com dados oficiais, como os recursos estão sendo aplicados. Isso nos dá condições de dialogar com os governos e cobrar políticas públicas mais eficientes”, afirma.
Ele destaca ainda que a sociedade, ao ter acesso a informações claras, pode se engajar mais nos debates sobre o futuro econômico e social do país.
Reforma inevitável
Especialistas alertam que, sem mudanças estruturais, a partir de 2027 o orçamento federal ficará engessado. Para Andrade, será necessário discutir uma reforma das despesas obrigatórias, reduzindo vinculações automáticas e criando mecanismos de revisão periódica de gastos, prática já adotada por países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
Enquanto isso, iniciativas como o Gasto Brasil buscam aproximar a população do debate. “Transparência é o primeiro passo para cobrar eficiência. A ferramenta coloca na mão da sociedade a chance de participar ativamente desse processo”, resume Felippe.